Dados reunidos pelo Ministério da Justiça revelam que o Brasil é o país que mais criou vagas no sistema carcerário nos últimos 20 anos. De 1990 para cá, a capacidade nos presídios brasileiros saltou de 60 mil para 298 mil vagas, uma expansão de 396%. Em segundo lugar estão os Estados Unidos, com 67% de aumento.
A explosão de vagas no regime prisional foi seguida pelo crescimento do número de presos, no mesmo período, de 90 mil que cumpriam pena em cerca de 600 unidades para quase meio milhão distribuídos em 1.857 prisões em 2010.
O aumento expressivo na capacidade das unidades prisionais não foi suficiente para minimizar o déficit de quase 198 mil vagas no sistema. O presidente do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária do Ministério da Justiça (CNPCP), Geder Luiz Rocha Gomes, explica um dos motivos para tamanho salto no número de presos:
"Há 20 anos, tínhamos cerca de 800 crimes previstos em lei. Agora, são cerca de 1.700".
Brasil gastou 99% do orçamento do sistema penitenciário para construir presídios
Somente o estado de São Paulo criou quase 40 mil vagas em seis anos.
"É um estado recordista mundial e já ganha de todos os países do mundo. Nenhuma nação no mundo criou quase 40 mil vagas entre 2003 e 2008", disse Geder.
Segundo ele, praticamente todo o orçamento destinado ao sistema penitenciário nos últimos anos (99%) foi gasto somente na construção de presídios.
O restante (1%) foi distribuído para todas as outras áreas, entre elas capacitação profissional do preso, investimento na capacitação de funcionários e formação educacional dos detentos.
Os números mínimos contrastam com a alta porcentagem de presos que não têm o primeiro grau completo (82%) e que não têm nenhum tipo de formação profissional (81%).
Na avaliação do presidente do CNPCP, as medidas dos últimos 20 anos não foram suficientes para resolver o controle da violência e da criminalidade:
"É um fato que demonstra que estamos tendo uma gestão equivocada. Os problemas sociais não podem ser transformados em problemas penais".
Índice de reincidência no Brasil fica entre 70% e 85%, enquanto na França não passa de 20%
Em comparação com outros países, a situação brasileira é ainda mais vergonhosa. Enquanto na França o índice de reincidência dos presos que são soltos não ultrapassa 20%, no Brasil o índice está entre 70% e 85%. A maioria dos casos de retorno ao crime (50%) acontece ainda no primeiro ano de liberdade. No segundo ano, esta porcentagem cai para 16%.
Outra diferença é o modelo adotado nas prisões brasileiras. No México, por exemplo, o presidente do CNPCP visitou um presídio com 8 mil detentos. Lá, eles ficam em beliches, não há grades, e a circulação é livre pela galeria.
"O último homicídio acorrido ali já tinha mais de cinco anos e a última fuga já tinha mais de 10 anos. Isso porque o sistema de gerenciamento adotado é o de uma comunidade", explicou Geder.
Crimes leves e médios são 86% do total
Geder ressalta que o uso de medidas alternativas poderia diminuir essa massa que ocupa hoje os presídios Brasil afora. Mas ainda é pouco aplicada, já que apenas 10% das comarcas do país têm uma central de penas alternativas.
"A pena alternativa é uma ferramenta poderosa. Ela não retira da prisão, mas evita que as pessoas sejam encaminhadas para a cadeia", declarou Geder.
As medidas podem ser aplicadas em casos de crimes leves (aqueles com até dois anos de prisão, como ameaça, lesão corporal leve, calúnia e desacato) e médios (com até quatro anos de pena, como furto, estelionato, crimes de trânsito, entre outros). Estima-se que 86% dos crimes cometidos no Brasil pertencem a este universo.
Mudanças no Código de Processo Penal que entraram em vigor na última segunda-feira também podem ajudar a diminuir a população carcerária. De acordo com as alterações, pelo menos 219.470 mil presos provisórios (que ainda aguardam julgamento) em todo o país podem ser libertados e no no lugar da prisão, o juiz poderá determinar uma série de alternativas. Na prática, a prisão preventiva passa agora a ser decretada como último recurso para crimes com penas inferiores a quatro anos.
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