Eis um período – para mim - maravilhosamente propício para a reflexão sobre Vida, Liberdade, Renascimento, Ritos de Passagem... Hipocrisia, Angústia, Poder, Solidão! Desde criança – na catequese por queridas freiras holandesas e padres católicos - que eu achava muito estranho o fato de Jesus ter sido recebido de forma imensamente triunfal “como Rei e Salvador” pelo mesmo povo que em poucos dias gritavam “Crucifica-o, Crucifica-o”... Eu - pequeninha, magrela e de imensas tranças – ficava pensando “que gente mais falsa...”
O Domingo de Ramos é exemplar! Jesus – debochado por muitos como o “filho do carpinteiro e de Maria” (aliás, pensemos o que sofreu Maria diante das línguas cínicas e ferinas das víboras fofoqueiras...) – que já tinha, de chicote na mão, literalmente botado pra quebrar no templo cheio de farsantes e vendilhões... entra de Jumentinho e é saudado entusiasticamente pela multidão! O Poder Local – César, Pilatos e Cia – em conluio mais que atual, demonstra à multidão que quem estiver ao lado do Rei dos Céus estará contra o Rei da Terra... aí o coeficiente de trairagem popular aumentou velozmente e foram aplaudidas todas as formas de humilhações (da brutalidade nas agressões físicas às cusparadas e xingamentos preconceituosos!). E se faz necessário lembrar que, com raríssimas exceções masculinas, a linda coragem da solidariedade a Jesus, no episódio, ficou mesmo para as mulheres!
O Monte das Oliveiras é outro momento de imensa intensidade espiritual e angústia absolutamente humana... onde Jesus, mesmo tomado pela Fé e Orações, demonstra tanto sofrimento, tristeza e medo... o retrato da humildade das nossas fraquezas humanas, seja nos apóstolos que dormiam ou na extrema exaustão emocional de Jesus que o leva a suar gotas de sangue. E durante a Crucificação, além do perdão e da opção pelo sacrifício, se apresenta também o doloroso sentimento de abandono e solidão gemendo na frase “Eloí Eloí, lema sabactâni...Meu Deus, Meu Deus, por que me abandonaste...”
E a Páscoa? Ah! Além dos deliciosos ovos de chocolate para alguns que podem comprar... A Páscoa verdadeira em nosso tempo não chegou! Muitos de nós estamos lutando por ela irmanados nos Ritos de Passagem: Escravidão e Liberdade do Povo de Deus, Morte e Renascimento de Jesus! Infelizmente ainda persistem o sofrido caminhar de muitos nas travessias dos desertos de indigência social; nas peregrinações de humilhações extremas por vagas nas escolas e assistência à saúde; nas horas de angústia e desespero em ônibus superlotados; nos escombros sob as chuvas soterrando crianças; nas infames vendas de órfãos para ricos pedófilos e virgindades de meninas para bandidos políticos; na exploração insaciável e predatória da natureza... e em tantas outras formas de Violência, Escravidão e Morte...
A Páscoa chegará quando a música, em belos adágios por violinos e flautas, estiver sendo tocada por pequenas mãos pobres e frágeis de crianças que o maldito narcotráfico machucou, mas não aniquilou... A Páscoa chegará quando não ensinarmos às nossas crianças a prática desrespeitosa das palavras humilhantes e malditas “negrinha, doido, aleijado, bicha”... A Páscoa chegará quando os idosos estiverem sendo contemplados com profundo respeito às marcas que o tempo deixou... A Páscoa chegará quando não se ostentar por vaidade luxuosa as peles de animais no vestuário... A Páscoa chegará quando a intolerância religiosa for extirpada e o oportunismo vulgar e comercial em nome de Deus for superado...
Alguns dirão que tudo isso é romantismo ridículo e impossível de se concretizar... Alguns vão preferir simplesmente fazer de conta que nada vêm nas dores e sofrimento do mundo crucificado... E euzinha e muitos outros mais repetiremos Cecília: “É preciso não esquecer nada...nem o sorriso para os infelizes, nem a oração de cada instante... O que é preciso esquecer... é o dia carregado de atos e a idéia de recompensa e glória...”
Felizes todos os dias em que buscamos a Páscoa... nas Travessias em Lágrimas pelos Desertos ou em Caminhos Perfumados de Jasmins, Angélicas, Lírios e todas as Flores que anunciam a Generosa Festa da Colheita de Paz e Justiça Social que um dia chegará!
Heloísa Helena
FAÇO MINHAS AS SUAS SENSATAS PALAVRAS...
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